sábado, 29 de novembro de 2008

Reagir ou não.

Bom dia!

Talvez a notícia nem tenha chegado ao senhor. Pois ela é uma notícia que não interessa à todos, infelizmente.

Dia 21 de novembro aconteceu um incêndio na favela Alba, perto do Aeroporto de Congonhas, aqui em São Paulo. 800 pessoas ficaram desabrigadas e havia comentários da morte de uma menina de 1 ano apenas.

Eu estive alí no sábado, dia seguinte. Participo de um projeto de alfabetização, esporte e lazer pra criançada de lá. O lugar onde utilizamos para realizar as atividades também estava servindo de base para os desabrigados. Havia alí pessoas do governo alocando o pessoal e organizando as doações que chegavam.

Estava dando minha aula pra rapazeada quando dois jovens, um homem e uma menina, me pediram informações sobre onde estavam sendo recebidas as doações. Fiz questão de acompanhá-los. No breve caminho fui puxando um papo com eles. Eles eram de Higienópolis e estavam ali para saber quantas fraldas, alimentos e outras coisas básicas o desabrigados estavam precisando. Eles iam doar o necessário. Aquilo me chamou a atenção. Queria perguntar o porquê daquilo! O que faz dois jovens num sábado, sair de Higienópolis e ir até uma favela para ver se precisavam de doação? Sem contar que logo depois caiu uma chuva nervosa. Infelizmente o caminho era breve demais e o papo não teve continuidade.

Depois de tudo terminado, no caminho de volta para minha casa, voltei a pensar nisso. E convido o senhor a pensar também.

As pessoas sentem a necessidade de fazer o bem. Pelo menos cheguei nessa conclusão. E não digo 'necessidade' pelo objetivo de manter uma imagem, status, não. Alguns colocam esse desejo em prática, outros não. Não sei como essa notícia chegou a esses jovens - e nem perguntei os nomes deles! -, porque na TV não apareceu, não! As vezes as coisas chegam até nós nos dando a oportunidade da fazer o bem. E somos livres. Podemos fingir que não vemos, ou reagir.

Esses dois reagiram. Sorte dos desabrigados. E minha! Que pude ver.

Acho interessante quando famosos fazem doações em alta escala quando acontece catástrofes mundias. Lembro que o Shumacher fez uma tremenda doação para a reconstrução dos locais atingidos pelo tsunami. Quinta-feira mesmo Guga e o Massa fizeram doações em prol dos recentes acontecimentos em Santa Catarina.

Mas não sei. Penso que é mais simples, natural e eficiênte ajudarmos quem está ao nosso redor. "Amar os pobres lá da África é fácil. O cheiro deles não chega até você.", diria um amigo meu. E faz sentido. Há tantas coisas que fazer no nosso bairro mesmo, não é?

Pra finalizar, uma historinha bem curta:

Um dia uma repórter americana quis passar um dia inteiro com Madre Teresa - não se faz necessário apresentação - para ver como era o dia-a-dia dessa mulher.
No final do dia, essa reporter surpreendiado com o cotidiano da madre, diz:
-Madre, não faria isso que a senhora faz nem por U$1 milhão!
-Filha (um sorriso terno no rosto), por U$1 milhão?? Nem eu filha, nem eu!

Um forte abraço! E um ótimo sábado! Tá um dia bonito!


@Thiago Vendramini

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Fenômeno Global

Tem sido difícil para mim escrever no blog. Além do tempo, também estou com um déficit criativo. E também o fator "temas". Os sites de notícias quase só falam da crise mundial, e que me sinto muito distante desse universo para poder prosear a respeito (sou de humanas). Estava então a ponto de falar da previsão do tempo, mas aí me toquei de que havia um tema ainda não abordado: Barack Obama.

Eleito novo presidente dos Estados Unidos, Obama foi não só o homem da popularidade lá, mas também pelo resto do globo. O número de imagens dele no oriente, na europa, em capas de revistas, camisetas de não americanos, bonés, etc. é algo interessante enquanto fenômeno social. Se tem proclamado em alguns lugares que essa crise seria o fim da hegemonia americana no mundo, mas ao que parece, essa "hegemonia" está muito além da economia. Mas será esse o único motivo desse "SuperObama"? Vejamos...

A era da informação está a todo vapor, com cada vez mais recursos para a posse de informações instantânea do globo inteiro. Há também o novo meio comunicacional da blogosfera (termo bastante controverso...), onde você não mais precisa ser especialista no assunto para discorrer sobre ele (e atualmente, os japoneses mostraram que nem gente precisa ser). Através desses novos paradigmas midiáticos, o alcance da imagem de Obama foi próximo à "onipresença"! Todos que tinham pelo menos acesso à televisão conheciam esse nome e essa figura. E como se formou essa opinião sobre sua personalidade? Como Obama foi chegar ao posto de salvador do mundo? Eu aponto um dos motivos de forma bastante segura e sem medo de ofender alguém no seguinte: Obama é afro-americano.

E tenho certeza que o leitor concorda. Ele representa a minoria, representa os excluídos, e representa a mudança (inclusive usada como slogan para sua campanha). E essa força chegou a tal ponto que quando ganhou, pessoas que votaram em McCain ficaram com vergonha de o dizer, pois este ficou com a cara da burocracia estagnada e elitista do governo anterior. 

Tudo isso chama a atenção também para a questão do racismo nos Estados Unidos e no mundo, que poderia ser entendido não só como racismo, mas toda forma de discriminação, tema também usado por Obama de forma "discreta" no seu discurso da vitória. Sobre isso, seguem alguns links sobre: Neonazistas que queriam a cabeça do presidente, A inexistência do Obama Britânico, Diversidade que elegeu obama, e tendência à "tolerância racial" (essa expressão usada pelo jornal é horrível... Tolerar está no limite do expressar desgosto, o que de fato possui conotações também racistas). E mais um link bastante interessante sobre um dos piores problemas que Obama terá que enfrentar como presidente... 

Peço desculpa pela superficialidade do post. Há diversos outros fatores que influenciaram na formação da imagem do presidente, como as diferenças entre democratas e republicanos, sua origem, suas propostas, as mídias, o seu concorrente, etc., mas que, além de eu sei incapaz de tratar delas de forma satisfatória, comeriam demasiado tempo do nosso ocupado leitor.

@Eduardo Kasparevicis

terça-feira, 4 de novembro de 2008

A liberdade de ver os outros

Estimados,

hoje convido-os a leitura de um texto espetacular. Pelo menos ao meu ver. O texto é de David Foster Wallace. Foi o discurso da formatura de sua turma na faculdade. Como é grande (duas páginas e meia no Word), passo o link onde a revista Piauí postou. O título do texto é "A liberdade ver os outros".

O interessante - e fundamental! - é que, aos 46 anos, ele se matou enforcando-se. E justo neste discursso ele fala sobre a morte e sobre o desespero que as pessoas passam pela vida. Mas em nenhum momento falou sobre o dele. Pelo contrário.

Enviei esse texto por e-mail a uma pessoa que amo muito (essas últimas duas palavras poderiam ser dadas com inútil ao post, mas não para mim) e ela me respondeu assim:

"Legal, Tico[um carinhoso apelido que levo há algum tempo].
Tem o grande mérito de ser um alerta para todos. Mas parece que foi mesmo um grito de desespero, de quem passou do ponto e já não podia mais voltar. O suicídio foi anunciado. A Verdade (com V maíusculo) sem a perspectiva da eternidade leva a um beco sem saída, não tem sentido que satisfassa.
Beijos"

'iQue fuerte!', diria algum espanhol.

De fato. Fortíssimo!

Desde que li esse texto, uso-o como apoio, entre outros, para um post (talvez não um post já que, pelo jeito, vai ficar um pouco extenso. Também por isso a minha demora em postar aqui no blog) sobre 'A consciência'. Lendo assim o título "A consciência" pode parecer um pouco sombrio e até assustador (haha), mas não direi nada do que o senhor não saiba.

Mas voltando ao texto de Wallace, transcrevo uma situação colocada por ele. Analisemos. É um pouco extenso, mas, por favor, leiam! Não irão se arrepender.

Você acordou de manhã, foi para seu prestigiado emprego, suou a camisa por nove ou dez horas e, ao final do dia, está cansado, estressado, e tudo que deseja é chegar em casa, comer um bom prato de comida, talvez relaxar por umas horas, e depois ir para cama, porque terá de acordar cedo e fazer tudo de novo. Mas aí lembra que não tem comida na geladeira. Você não teve tempo de fazer compras naquela semana, e agora precisa entrar no carro e ir ao supermercado. Nesse final de dia, o trânsito está uma lástima. Quando você finalmente chega lá, o supermercado está lotado, horrivelmente iluminado com lâmpadas fluorescentes e impregnado de uma música ambiente de matar. É o último lugar do mundo onde você gostaria de estar, mas não dá para entrar e sair rapidinho: é preciso percorrer todos aqueles corredores superiluminados para encontrar o que procura, e manobrar seu carrinho de compras de rodinhas emperradas entre todas aquelas outras pessoas cansadas e apressadas com seus próprios carrinhos de compras. E, claro, há também aqueles idosos que não saem da frente, e as pessoas desnorteadas, e os adolescentes hiperativos que bloqueiam o corredor, e você tem que ranger os dentes, tentar ser educado, e pedir licença para que o deixem passar. Por fim, com todos os suprimentos no carrinho, percebe que, como não há caixas suficientes funcionando, a fila é imensa, o que é absurdo e irritante, mas você não pode descarregar toda a fúria na pobre da caixa que está à beira de um ataque de nervos. De qualquer modo, você acaba chegando à caixa, paga por sua comida e espera até que o cheque ou o cartão seja autenticado pela máquina, e depois ouve um “boa noite, volte sempre” numa voz que tem o som absoluto da morte. Na volta para casa, o trânsito está lento, pesado etc. e tal. É num momento corriqueiro e desprezível como esse que emerge a questão fundamental da escolha. O engarrafamento, os corredores lotados e as longas filas no supermercado me dão tempo de pensar. Se eu não tomar uma decisão consciente sobre como pensar a situação, ficarei irritado cada vez que for comprar comida, porque minha configuração padrão me leva a pensar que situações assim dizem respeito a mim, a minha fome, minha fadiga, meu desejo de chegar logo em casa. Parecerá sempre que as outras pessoas não passam de estorvos. E quem são elas, aliás? Quão repulsiva é a maioria, quão bovinas, e inexpressivas e desumanas parecem ser as da fila da caixa, quão enervantes e rudes as que falam alto nos celulares. Também posso passar o tempo no congestionamento zangado e indignado com todas essas vans, e utilitários e caminhões enormes e estúpidos, bloqueando as pistas, queimando seus imensos tanques de gasolina, egoístas e perdulários. Posso me aborrecer com os adesivos patrióticos ou religiosos, que sempre parecem estar nos automóveis mais potentes, dirigidos pelos motoristas mais feios, desatenciosos e agressivos, que costumam falar no celular enquanto fecham os outros, só para avançar uns 20 metros idiotas no engarrafamento. Ou posso me deter sobre como os filhos dos nossos filhos nos desprezarão por desperdiçarmos todo o combustível do futuro, e provavelmente estragarmos o clima, e quão mal-acostumados e estúpidos e repugnantes todos nós somos, e como tudo isso é simplesmente pavoroso etc. e tal. Se opto conscientemente por seguir essa linha de pensamento, ótimo, muitos de nós somos assim – só que pensar dessa maneira tende a ser tão automático que sequer precisa ser uma opção. Ela deriva da minha configuração padrão. Mas existem outras formas de pensar. Posso, por exemplo, me forçar a aceitar a possibilidade de que os outros na fila do supermercado estão tão entediados e frustrados quanto eu, e, no cômputo geral, algumas dessas pessoas provavelmente têm vidas bem mais difíceis, tediosas ou dolorosas do que eu. Fazer isso é difícil, requer força de vontade e empenho mental. Se vocês forem como eu, alguns dias não conseguirão fazê-lo, ou simplesmente não estarão a fim. Mas, na maioria dos dias, se estiverem atentos o bastante para escolher, poderão preferir olhar melhor para essa mulher gorducha, inexpressiva e estressada que acabou de berrar com a filhinha na fila da caixa. Talvez ela não seja habitualmente assim. Talvez ela tenha passado as três últimas noites em claro, segurando a mão do marido que está morrendo. Ou talvez essa mulher seja a funcionária mal remunerada do Departamento de Trânsito que, ontem mesmo, por meio de um pequeno gesto de bondade burocrática, ajudou algum conhecido seu a resolver um problema insolúvel de documentação.
Claro que nada disso é provável, mas tampouco é impossível. Tudo depende do que vocês queiram levar em conta. Se estiverem automaticamente convictos de conhecerem toda a realidade, vocês, assim como eu, não levarão em conta possibilidades que não sejam inúteis e irritantes. Mas, se vocês aprenderam como pensar, saberão que têm outras opções. Está ao alcance de vocês vivenciarem uma situação “inferno do consumidor” não apenas como significativa, mas como iluminada pela mesma força que acendeu as estrelas.

O bom de pegar textos assim é que eles dispensam comentários. São riquíssimos!

Para quem vive em São Paulo, como eu, não é difícil de imaginar a situação. Eu tenho a mamãe que não deixa a comida faltar, mas o termo "não tem comida na geladeira" pode ser muito bem substituido por "pegar a filha na escola", "passar na casa de um amigo para ajudá-lo a estudar", "comprar pão", "devolver o filme na locadora" e assim vai.

A todo momento somos exigidos de algum modo. Às vezes por coisas simples, outras por grandes dificuldades. O importante é jamais acharmos que somos as vítimas da história e que os outros estão conspirando contra nós.

Sempre achamos que a vida dos outros é moleza e a nossa um osso duro de roer.

Um dia um amigo meu me falou em tom de brincadeira, mas guardei a expressão: "Você só vê as pingas que eu tomo, mas meus capotes não!"

De fato. Pimenta no olho do outro é colírio!

Não tenho muito o que acrescentar ao texto do Wallace, vale a pena ler outra vez. E outra.

Um abraço!

@Thiago Vendramini